Alguns casos são mais emblemáticos e marcam nossas vidas para sempre. Desde que o ocorrido abaixo aconteceu comigo, tendo a acreditar que esses casos acontecem no início da carreira, quando mesmo inseguros e até mesmo despreparados em algum nível, nós comparecemos mesmo assim, nós peticionamos e fazemos audiências e sustentações orais mesmo assim, porque essa é a gênese da toda a experiência que vai embasar nossa carreira.
Também por isso, o início na advocacia exige mergulhar na famosa “clínica geral” sobretudo se você se formou em outro estado, viveu a experiência do estágio na segunda maior capital do país e, de repente, viu-se de volta ao interior, como aconteceu comigo.
Pois bem. Logo depois de terminar o curso de Direito na UFRRJ, eu tive que voltar para a minha cidade no interior de São Paulo e, por motivos de saúde, fiquei lá por algum tempo, onde o costume é não dispensar nenhum caso, seja lá qual for, de que área for. Se por um lado não há uma especificação, por outro, os advogados do interior não têm medo do desafio e isso me ensinou muito.
Mas, foi particularmente em um caso de direitos reais que a chave da Advogada Olívia virou. Sabe quando você aceita pegar um caso achando que vai ser simples? Uma reintegração de posse (pensa bem, hoje sou advogada previdenciária), com todas as provas possíveis de posse e propriedade, sinceramente, não poderia ser mais descomplicado! Exceto que foi.
Logo na inicial, eu anexei um boletim de ocorrência feito pelos meus clientes e, na minha cabeça de jovem advogada, não havia qualquer problema com a prova, afinal, eu estava comprovando que há anos meus clientes brigavam com os ocupantes pela posse do terreno de que eram donos, o problema é que com o boletim de ocorrência, eu também comprovei o usucapião da outra parte que, nada obstante, valeu-se do mesmo em sua defesa (que por sinal, foi impecável).
Sinceramente, eu perdi o chão! Passei minha réplica toda impugnando minha própria prova, explicando ao juiz a unilateridade do boletim de ocorrência, pedindo a fungibilidade da ação para a petitória, buscando qualquer saída que me impedisse de causar tamanho dano material para os meus clientes, afinal, se tem uma coisa que eu sempre tive consciência é que na advocacia, nós estamos lidando com vidas e nesse caso não era diferente, o terreno sobre o qual versava a ação foi resultado de uma vida de trabalho, era o único investimento do casal.
Prosseguimos para a audiência de instrução. Momentos antes, eu passei por todos os imbróglios físicos que uma jovem advogada pode sentir: náuseas, dores de cabeça, suor frio, borboletas no estômago, ânsia, etc. Toda essa sensação só passou quando o juiz começou a ouvir as testemunhas e repetir absolutamente tudo que estava na minha réplica, o quanto era raro uma pessoa deixar ao léu o seu bem imóvel, o quanto era pouco crível que o ocupante exerceu a posse pacífica e mesmo quando a parte contrária suscitou o boletim de ocorrência, o magistrado simplesmente afirmou que isso tinha ficado no passado.
A sensação de que o juiz está do seu lado te fazer crescer, todas as sensações citadas acima foram embora e eu virei outra pessoa, imparável, como se nunca tivesse errado ao início (mas é bom não esquecer: eu errei).
No final das contas, fizemos um acordo e meus clientes recuperaram o terreno mediante o pagamento das benfeitorias realizadas pelo ocupante. Até hoje, sinto a sensação de vitória quando lembro desse caso. Se em alguns nós já obtemos sucesso, em outros, o sucesso é dar a volta por cima.
Assim sendo, aprendi que enquanto houver argumentação, por mais inócua que parece, não existe nada perdido e que uma audiência bem feita pode mesmo desfazer um erro.